Covid-19 – Quem será o eleito?

Mais uma vez colaborando com o Portal Guaçuano o Professor Igor Rapp , escreve sobre o Tema que esta sendo mais comentado no momento no nosso Brasil e Mundo aCOVID-19.

Covid-19 – Quem será o eleito?

Olá pessoas! Como estão de quarentena? Antes de mais nada… fique em casa por favor. Peço isso porque ainda somos incapazes de tratar a covid-19. Incapazes de tratar, mas não de buscar alternativas. Nesse texto vou mostrar como equipes de cientistas do mundo inteiro estão tentando buscar formas de combater essa que é uma das maiores ameaças a humanidade dos últimos 20 anos. Parte dessa ameaça é por que, embora conheçamos outros coronavírus, o SARS-Cov2 é novo, atingindo de maneira inesperada a segunda maior economia do mundo. Um fator desconhecido e imprevisível nos apavora, mas esse é um assunto para um próximo texto. Nesse, vamos focar no desenvolvimento de um tratamento eficaz e seguro a humanidade contra a Covid-19. Esse tratamento pode ser uma vacina, uma nova droga ou fármacos já conhecidos. A escolha deve levar em consideração vários fatores, como disponibilidade, eficiência, nível de segurança, efeitos colaterais e tempo para o desenvolvimento. Antes de mais nada, a intenção desse texto é trazer informação de qualidade e aproximar de vocês o que de mais avançado está sendo feito nos centros de pesquisa, não esperem sair desse texto experts no assunto. A formação de um farmacologista demora anos e esse texto não substitui, de maneira nenhuma, todos esses anos. Aqui vocês encontrarão um pequeno resumo das atuais pesquisas na procura de um tratamento para a Covid-19. Acho importante fazer isso agora, pois estamos em um momento crítico de descrença e apreensão. Com esse texto gostaria de apresentar esperanças e mostrar que, apesar de necessitarmos de precaução, estamos bem e vamos sair dessa. Além disso, gostaria de deixar claro, que a hidroxicloroquina não é nem de longe o mais eficiente dos medicamentos testados, fazendo um pouco de contraponto com o que está sendo veiculado. Além disso antes de saber sobre a droga, os pesquisadores olham para a doença e para o seu causador. Analisamos, os sintomas, os efeitos, as formas de invasão. Esse rastreamento tem uma única intenção: entender para destruir. Sabendo tudo sobre o nosso inimigo, sabemos toda a extensão dos “seus poderes”, mas também saberemos as suas falhas e quais podem ser os nossos alvos. Para quem assistiu World War Z, sabe bem sobre o que estou escrevendo, para quem não assistiu, fica a dica. Mas contra o SARS-Cov2, já temos alguns alvos “travados”. Trabalhos “quentinhos” de revistas científicas mostram dois desses alvos. Para explicar melhor, prestem atenção no esquema abaixo:

Figura 1. Ciclo de replicação do SARS-Cov2 dentro da célula. O vírus liga-se a proteína ACE2, situada na membrana plasmática das células pulmonares. Com isso, ele entra na célula. Com a abertura da cápsula o material genético (RNA+) começa a agir. Utiliza os ribossomos para a produção de proteínas. Aqui entra em ação a “editora” de proteínas, a Mpro. Essa proteína é responsável por produzir a transcriptase. Essa, por sua vez, produzirá fitas moldes de RNA(-) e baseada nisso a célula produz as cópias positivas. O RNA(+) é aquele que estará contido nas novas cópias do SARS-Cov2. Após a entrada dessas cópias nas cápsulas já produzidas, os vírus são liberados

O esquema mostra o ciclo de multiplicação do SARS-Cov2. Para entrar na célula, o vírus deve utilizar uma chave. Essa chave é chamada Spike, é uma proteína que se liga a um receptor da membrana da célula e essa interação garante a entrada do vírus. Dessa forma, entender como as duas proteínas se ligam é importante, uma vez que podemos criar medicamentos que bloqueiem essa interação. Uma vez dentro da célula, o vírus deve garantir que as suas proteínas sejam produzidas e para isso ele possui uma proteína especializada em edição. Essa proteína editora é chamada Mpro e se entendermos como exatamente ela faz a edição, saberemos como anular a sua função. Os trabalhos em questão analisaram a estrutura, como os blocos básicos dessas proteínas se encaixam e como elas se comportam ligadas a outras Figura 1. Ciclo de replicação do SARS-Cov2 dentro da célula. O vírus liga-se a proteína ACE2, situada na membrana plasmática das células pulmonares. Com isso, ele entra na célula. Com a abertura da cápsula o material genético (RNA+) começa a agir. Utiliza os ribossomos para a produção de proteínas. Aqui entra em ação a “editora” de proteínas, a Mpro. Essa proteína é responsável por produzir a transcriptase. Essa, por sua vez, produzirá fitas moldes de RNA(-) e baseada nisso a célula produz as cópias positivas. O RNA(+) é aquele que estará contido nas novas cópias do SARS-Cov2. Após a entrada dessas cópias nas cápsulas já produzidas, os vírus são liberados. proteínas. Todos esses parâmetros foram utilizados para “projetar” modelos computadorizados. A partir desses dados, um novo fármaco foi desenvolvido e mostrou o efeito de bloquear a Mpro. Quando células pulmonares infectadas com SARS-Cov-2 foram colocadas em contato com esse fármaco, houve bloqueio da replicação do vírus. Os testes ainda estão na fase pré-clínica, ou seja, ainda deve passar por animais e depois entrar na fase clínica (testes em humanos), mas são promissores. Em outro estudo, os pesquisadores utilizaram esses modelos computadorizados da Spike para produzir sequências de proteínas específicas que, futuramente, poderão fazer parte do processo de desenvolvimento de vacinas. Embora esses estudos sejam muito promissores, o desenvolvimento de um novo fármaco a partir deles pode levar anos. Além disso, nenhum deles traz dados suficientes sobre eficiência em seres vivos, níveis de segurança na utilização, quais os efeitos adversos. Por isso, são promessas para daqui a alguns anos. Então como podemos acelerar o desenvolvimento? A cloroquina e a hidroxicloroquina, tão alardeadas como “a salvação”, são a resposta. Ou seja, utilizar antigos medicamentos, conhecidos e com a sua segurança testada, reposicionando-os para o combate de novas doenças. Mas para isso, ajustes devem ser feitos nas doses, uma vez que os agentes infecciosos se comportam de maneira diferente. Esses dois medicamentos iniciaram os seus serviços na década de 1940 no combate da malária. São ótimos nesse sentido. É preciso somente 500 mg por semana durante 4 semanas para que a malária seja vencida. Mas se administrados em doses altas demais (acima de 250 mg por dia) podem causar diminuição da acuidade visual e auditiva, além de problemas no coração. Os melhores resultados com a hidroxicloroquina foram achados em um trabalho de uma equipe francesa. Nesse trabalho, a melhora das condições dos pacientes e a multiplicação do vírus foram monitoradas por 14 dias em um grupo de 20 infectados tratados com três doses diárias de 200 mg de hidroxicloroquina. Além de terem recebido mais do que o dobro da máxima dose permitida, o estudo “escorrega” em outros conceitos. O número de participantes foi muito pequeno. Para se ter uma ideia, a última fase de descoberta de qualquer novo fármaco leva em consideração estudos com mais de 10 mil participantes. Além disso, esses estudos de última fase fazem uso de um mecanismo chamado duplo-cego. Nesse mecanismo, nem quem dá o tratamento, nem quem é paciente sabem, ao certo, quem está recebendo, de fato, o novo tratamento. Isso garante que nem o pesquisador e nem o paciente vão induzir as respostas. Ou seja, mesmo que os resultados sejam promissores, eles não são exatamente confiáveis. E se falarmos sobre como a cloroquina age, ela seria excluída no ato. Isso por que ela não age sobre o funcionamento do vírus, ela age congestionando e confundindo o funcionamento de todas as células do corpo. Seria a mesma coisa que acertar um caramujo com uma bola de demolição. Você até consegue, mas leva junto tudo que está em torno do pobre animal. Agora você consegue entender os efeitos colaterais? Outra aposta é a reutilização de medicamentos que já foram testadas contra outro vírus. Utilizando uma combinação de dois antivirais utilizados para o HIV, o lopinavir e o ritonavir, uma equipe chinesa observou que houve a diminuição de mortalidade e do tempo de UTI de pacientes tratados. Além disso, as chances de melhora até o 14° dia subiram de 30% para os pacientes não tratados com a mistura para 45% no grupo que recebeu o tratamento. Contudo, não foi constatado a diminuição da carga de vírus em comparação com o grupo sem tratamento. Embora o sucesso seja preliminar, a ideia de diminuir o tempo de UTI dos pacientes é interessante, sendo a lotação dos hospitais é um dos problemas mais graves em relação a Covid-19. Brasileiros da Fiocruz verificaram a chance de utilizar o atazanavir (ATZ) e o lopinavir (LPV) para o tratamento da Covid-19. Nesse trabalho, os pesquisadores fizeram a modelagem computacional da Mpro e analisaram como ocorre a interação entre os medicamentos e a proteína-alvo. Com isso, notaram que a interação ATZ-Mpro é mais intensa do que a interação LPV-Mpro. Depois, em experimentos reais, mostraram que a ATZ e a LPV são capazes de inibir a Mpro (lembra a editora de proteínas?). Após isso, o grupo utilizou células pulmonares infectadas com SARS-Cov2 para determinar qual formulação era a mais eficaz. Entre ATZ sozinho, Cloroquina e uma combinação ATZ/LPV, “ganhou” essa última. Agora os testes devem ser em animais e depois em humanos. Os tratamentos aqui enumerados inspiraram uma iniciativa da OMS chamada SOLIDARITY. Nessa iniciativa, a OMS certificou centros de pesquisa ao redor do mundo (uma delas é a UNICAMP) para testar em pacientes quatro propostas de tratamento: 1) Remdesivir, 2)Lopinavir/Ritonavir, 3) Cloroquina e 4) Hidroxicloroquina. O Instituto de Saúde francês (INSERM) fará um estudo com 3200 pacientes para testar os mesmos fármacos. Aqui um esquema resumindo os estudos que relatei.

Figura 2. Etapas do ciclo bloqueadas pelos fármacos do texto. A Cloroquina entra na célula e impede o funcionamento norma das vesículas que guardam o vírus. ATZ/LPV/RTV agem inibindo a “editora” Mpro o que bloqueia a multiplicação dos vírus. O remdesevir bloqueia a replicação do material genético do vírus.

Além de todos esses tratamentos, alguns grupos ainda estão olhando para a doença. Tais grupos notaram algumas características muito interessantes da doença. Primeiro, a covid-19 causa uma inflamação generalizada no corpo inteiro, o que pode levar a morte. Segundo, em grande parte dos pacientes há coagulação do sangue. Isso pode levar a formação de trombos pulmonares e a piora do quadro de dificuldade respiratória. Em alguns casos, há a melhora do quadro do paciente se for utilizado algum anticoagulante ou anti-inflamatórios. Todos esses são tratamentos são experimentais, não há nada comprovado. Muitos desses medicamentos são extremamente perigosos se tomado em doses erradas. Além disso, a determinação de doses eficazes, Figura 2. Etapas do ciclo bloqueadas pelos fármacos do texto. A Cloroquina entra na célula e impede o funcionamento norma das vesículas que guardam o vírus. ATZ/LPV/RTV agem inibindo a “editora” Mpro o que bloqueia a multiplicação dos vírus. O remdesevir bloqueia a replicação do material genético do vírus. regime de tratamento adequado e mais estudos são extremamente necessários para termos certeza. Outra coisa que poderia acelerar ainda mais o processo de descoberta da cura são maiores investimentos em pesquisas. Com mais dinheiro, seria possível a contratação de mais pessoas, a concessão de mais bolsas de estudos para pesquisadores, e a construção e adequação de centros de pesquisa. Enquanto isso não ocorre, o melhor mesmo é desacelerar o contágio ficando em casa, lavando as mãos e quando doentes, isolamento. Gostou do texto? Compartilhe com quem você conhece. Tem alguma dúvida ou crítica? Escreva para divulga.rapp@gmail.com. Quer saber mais: visite o meu canal no youtube: BioRapp.ou ainda o meu site https://igorrapp.wixsite.com/biolinda.

Professor: Igor Rapp.